Em 2018, uso de redes quase dobrou chance de voto em Bolsonaro

Estudo publicado nesta semana mostra relação estatística entre informação por redes sociais e voto em Bolsonaro na eleição de 2018.
Em 2018, uso de redes quase dobrou chance de voto em Bolsonaro
Arte: Rodolfo Almeida
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Nas eleições de 2018, brasileiros que consumiam informações políticas pelo WhatsApp, Youtube e Facebook tinham o dobro de chance de votarem no então candidato à presidência Jair Bolsonaro, concluiu um estudo de pesquisadores brasileiros publicado na segunda-feira (19.set.2022).


É importante porque...

Comprova estatisticamente o que se presumia desde 2018: que as redes sociais tiveram papel central em colocar Bolsonaro dentro da presidência.

Pesquisas anteriores que investigavam o porquê de Bolsonaro ter sido eleito olhavam para as redes sociais de modo secundário, sem demonstração empírica.


No primeiro turno, eleitores que usavam Facebook e WhatsApp como fonte de informação tinham 97% e 62% a mais de chances de votarem em Bolsonaro, respectivamente. Já no segundo turno, eleitores que consumiam informação política no Facebook, Youtube e WhatsApp tinham 70%, 91% e 96% a mais de chance de votarem em Bolsonaro, respectivamente.

O artigo foi publicado na revista científica Dados, editada pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – IESP-UERJ.

  • Metodologia: Os pesquisadores incluíram uso de mídias como uma variável independente, junto de populismo, medidas contextuais, ideologia, antipetismo, mobilidade social e dados demográficos. A variável dependente, por sua vez, era a declaração de ter votado em Bolsonaro. O artigo emprega dados do Estudo Eleitoral Brasileiro (Eseb), uma survey nacional pós-eleições realizada desde 2002 pela Unicamp.

Hegemonia da direita

"Com as novas mídias, a comunicação política se modificou de maneira muito substantiva", disse ao Núcleo Pedro Mundim, professor associado de Ciência Política da Universidade Federal de Goiás e um dos autores do artigo.

A adoção em larga escala de redes sociais por brasileiros tornou a comunicação direta, feita via redes sociais e sem intermediação da imprensa, uma estratégia mais efetiva.

Quem se deu bem com essa virada foi um político cujo enquadramento nas mídias tradicionais era, geralmente, negativo ou caricato.

Segundo Mundim, Bolsonaro largou à frente em 2018 porque já vinha usando essa forma de comunicação há mais tempo. Do outro lado, a esquerda demorou a perceber que havia alguém no campo oposto fazendo um uso eficiente das redes sociais.

"Isso gera um problema, porque se você tem um candidato que domina o uso dessas ferramentas comunicacionais de maneira muito substantiva, ele consegue, de certo modo, uma hegemonia da comunicação através das novas mídias e aí a mensagem que ele passa ressoa muito mais do que as outras."

A contra-estratégia é tentar equilibrar esse jogo, rompendo com a hegemonia da direita. Na avaliação do cientista político, o cenário hoje é mais equilibrado, uma demonstração de que a esquerda aprendeu a fazer uso mais habilidoso das redes.

Ainda um outro fator que explica o porquê de Bolsonaro ter surfado nas redes em 2018 é o contexto.

"As eleições não ocorrem num vácuo", lembrou o pesquisador. Havia ali um contexto muito favorável para o bolsonarismo por causa do anti-petismo e de outras questões, o que tornou o efeito das mensagens que ele disseminava ainda mais eficiente.

"Máquina bolsonarista"

O artigo também destaca que, para além do ambiente tecnológico, pessoas comuns tiveram papel fundamental em fazer essa comunicação descentralizada funcionar de maneira eficiente, já que muitos eleitores bolsonaristas assumiram a função de disseminar informações.

De acordo com os pesquisadores, "essa relação de comunicação em rede, construída pelas redes sociais ou aplicativos de mensageria, contribuiu para amplificar dinamicamente o alcance das mensagens, bandeiras e argumentos políticos do então-candidato".

Embora seja comum pensar em bots, redes inautênticas ou comportamentos automatizados, nas eleições de 2018 (como documentado no caso dos disparos em massa revelados pelo jornal Folha de S. Paulo) não se pode ignorar o papel de pessoas comuns.

"Você pegava um contexto onde o WhatsApp não tinha limite de compartilhamentos, você tinha uma 'máquina bolsonarista' usando o WhatsApp de maneira muito eficiente e depois o fluxo do negócio procedia, com as pessoas espalhando informação, seja fake news ou propaganda."

2022 NÃO É 2018

Se o contexto em 2018 era favorável para que Bolsonaro falasse direto com seu eleitor pelas redes, em 2022 a história não é tão simples.

"Em 2022, ele tem teto de vidro", disse Mundim. "É completamente diferente você ser alguém da oposição, podendo falar o que quiser sem responsabilidade – já que você pode falar de promessa, de conjecturas. Agora não mais, ele foi presidente e fez um governo cheio de problemas", afirmou o pesquisador.

A 'máquina' continua funcionando e pessoas comuns seguem disseminando informações, mas há restrições que não existiam em 2018, desde mudanças infraestrutura das plataformas (o WhatsApp limitou encaminhamentos) até mecanismos de resistência nos próprios eleitores.

"A força de influência das mensagens que ele tenta vincular hoje não tem a mesma ressonância na opinião pública justamente porque agora há um confronto com a realidade."

O fato de atores e grupos da esquerda terem entrado para o jogo também muda o cenário.

"Se você olha para 2018, a esquerda perdeu nesses ambientes e agora ela está pelo menos empatando. Quando ela empata, isso força o eleitor a fazer uma avaliação, uma decisão de voto com base em outros indicadores, que em tese são mais favoráveis para a esquerda, como por exemplo comparação de governos", explicou Mundim.

Reportagem Laís Martins
Arte Rodolfo Almeida
Edição Julianna Granjeia

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