Cadastre-se gratuitamente nas nossas newsletters

Se você acha que o Snapchat morreu, você provavelmente não é adolescente ou não curte muito o submundo dos nudes. O aplicativo que reinventou a efemeridade de conteúdo nas redes tem agora seu melhor momento na gringa desde o lançamento, há 10 anos: 500 milhões de usuários ativos por mês e em contínuo crescimento.

No Brasil, a rede não pegou muito, mas os números estão na casa dos milhões: levantamentos distintos do site Statista estimam entre 8,5 milhões e quase 12 milhões de usuários.


É importante porque...
  • Apesar de ter um número maior de usuários nos Estados Unidos, onde vem crescendo, aplicativo de fotos e vídeos, o Snapchat continua sendo usado no Brasil.
  • É uma rede mais popular entre adolescentes, porque o app elimina definitivamente postagens -- frequentemente nudes. Ali, os jovens também se sentem mais livres, porque pessoas mais velhas, como familiares, têm dificuldade em entender o funcionamento da plataforma.

Ao contrário de muitos aplicativos que hoje focam em países extremamente populosos, como China, Índia e mesmo o Brasil, o Snapchat tem vingado essencialmente nos Estados Unidos, onde concentra mais de 100 milhões de usuários, de acordo com dados do próprio Snapchat, seguido por Índia (99,8 mi), França (23,4 mi), Reino Unido (19,8 mi) e Arábia Saudita (19,1 mi). O Brasil, que invariavelmente lidera atividades em redes sociais, aparece apenas em 14º lugar.

Clique nos botões para trocar o gráfico

Ainda em julho, a Snap Inc. divulgou ter tido o melhor trimestre de sua história: a receita mais que dobrou em relação ao mesmo período do ano passado. As ações da empresa ultrapassaram US$ 70, mantendo-se acima desse patamar desde então (pelo menos até 25.ago.2021) -- uma valorização de mais de 200% desde quando começaram a ser negociadas na bolsa norte-americana, em 2017. Ainda assim, a empresa ainda não gera lucro.

Famoso pelos nudes

A avaliação é a de que o Snap manteve uma base fiel de adolescentes e segue um aplicativo popular particularmente entre os mais jovens, que veem nele um ambiente onde podem ficar longe dos adultos, que preferem o Facebook ou o Instagram.

Apesar de ter seu mais importante recurso reproduzido com sucesso por outras redes, só o Snapchat de fato garante a autodestruição das postagens.

"Eu voltei a usar depois que o Instagram começou a censurar alguns tipos de conteúdo, como foto de cueca", disse ao Núcleo Guilherme Sumpter, 26, um usuário do Snap.

"Às vezes a gente só quer uma rede mais despretensiosa para postar coisas aleatórias, e eu sinto que lá não tem tanta essa obrigação de só postar fotos conceituais, feliz, prato do dia, aquele típico 'lifestyle perfeito' que o instagram vem seguindo", completa.

"Hoje em dia é uma rede social bem segura para quem quer mandar os famosos nudes" - , completa Letícia Martins, 18, habituè do Snap

"Os caras só usam para isso mesmo, mas eu mantenho pelo contato que tenho com pessoas antigas que conheci lá."

Uma volta pela plataforma a partir de um endereço de IP do Brasil, por alguém sem conexões por lá, mostra essencialmente vídeos gringos de menos apelo do que os encontrados nas redes mais populares, como TikTok ou Instagram.

Uma seção traz um mapa de calor em que é possível ver, aleatoriamente, trivialidades de alguém em Istambul, Mônaco ou Olinda. Por ali, ainda é possível salvar locais de preferência, aos moldes do Google Maps.

Outro investimento do Snap Inc. foi o Spotlight, seção dentro do aplicativo criada para competir com o TikTok, em que usuários são confrontados com postagens de pessoas que não seguem. Outros atrativos incluem jogos, notícias e a transmissão de jogos e séries de TV.

Mais recentemente, o app passou a atacar outras frentes, como filtros de realidade aumentada. Segundo a desenvolvedora, o plano é que pessoas possam fazer compras virtualmente, vendo pelo app como ficariam com determinadas roupas, por exemplo

Outras novas ferramentas anunciadas são o Screenshop, que permitirá a consumidores "escanear" a roupa de um amigo para descobrir onde comprar outra igual, e a Connected Lenses, com a qual pessoas separadas interagem com as mesmas lentes, como uma que simula uma brincadeira de Lego à distância.

.

Hoje o conceito de imagens que desaparecem e o uso de filtros parece banal, mas foi o Snapchat que começou com isso. Criado em setembro de 2011 por três estudantes de graduação de Stanford, universidade da Califórnia conhecida por ser o berço de boa parte das inovações do Vale do Silício, o objetivo inicial do app era fazer desaparecer mensagens que um deles enviava para uma garota. 

A ideia se mostrou rapidamente boa e o Snapchat bombou em pouco tempo, particularmente entre adolescentes. 

Desde então, são eles ainda que engrossam o público do Snap, por uma série de motivos que vão desde a dificuldade de pessoas mais velhas para navegar pelo aplicativo à adesão dos jovens a ideia de experiência passageira, em detrimento da memória (em termos mais práticos, ao fato de que a narrativa postada irá desaparecer para sempre). 

Mas o bom desempenho da rede fez dela uma ameaça aos empreendimentos de Mark Zuckerberg, que tentou comprar a rival diversas vezes. Com a recusa de venda pelos fundadores do Snap, apesar das cifras bilionárias, veio a lei do mais forte, e o aplicativo foi engolido por uma reação agressiva de Zuckerberg, que reproduziu seus recursos no Facebook, Instagram e WhatsApp. 

Com uma base muito mais ampla e fiel de usuários, a estratégia deu certo -- em menos de um ano, os Stories, do Instagram, já tinham quase o dobro do número de usuários. Ao contrário do Snap, que empacou no meio do caminho.

A aparente declaração de óbito veio em fevereiro de 2018, quando a socialite Kylie Jenner martelou o que seria o último prego do caixão ao tuitar despojadamente um "Entãaaaao, alguém ainda usa o Snapchat?". Não muito depois, as ações da empresa caíram, influenciadas também por uma renovação da plataforma que desagradou usuários.

Entre as mudanças anunciadas naquele ano, estava a separação entre amigos, marcas e celebridades em seções diferentes do aplicativo, enquanto stories e chats foram condensados na mesma página, sem uma ordem cronológica, mas seguindo um algoritmo que previa o interesse do usuário por seus contatos. Mais de 1,2 milhão de pessoas assinaram uma petição online à época pedindo o retorno do design original. 

Snap brasileiro

A plataforma não tem uma equipe dedicada no país. Assessoria de imprensa brasileira não existe, reclamações de usuários no Reclame Aqui não são respondidas, sua conta oficial no Facebook está às moscas desde 2019.

Segundo levantamento do Statista feito a partir de dados do Hootsuite e dos relatórios divulgados pelo Snapchat para investidores, em janeiro deste ano havia 11,95 milhões de usuários do Snapchat no Brasil (maior estimativa). O número é menor do que no México, apesar de a nossa população ser 65% maior: lá, ao menos 17,95 milhões de pessoas usam a rede.

O resultado é interessante, já que o Brasil é um dos maiores mercados de redes sociais no mundo.

Como comparação, o país sozinho é estimada por 10% do público no TikTok

Dados do Statista baseados na consultoria de aplicativos móveis Sensor Tower.

. Mas no caso do Snap, outro país latino-americano tem bem mais de usuários.

Ainda assim, uma estimativa do site Statista, que compila dados de mercado e consumidores, mostra que o Snapchat também cresceu em adeptos brasileiros nos últimos anos, tendo também se beneficiado do isolamento social provocado pela pandemia do coronavírus, como quase tudo online.

snapchat_brasil_est3

Houve por aqui um aumento de 70% no número de usuários ativos mensalmente no app desde 2017, logo após o Instagram Stories ser criado. Em 2018, a rede perdeu público, mas voltou a crescer em 2020. A expectativa, segundo a estimativa, é de que o Snapchat continue crescendo no Brasil ao menos até 2025, embora seja impossível prever o que mais pode surgir, ou ser copiado, no meio do caminho.

Como fizemos isso

O Núcleo levantou dados sobre o uso do Snapchat no Brasil e no exterior pela plataforma Statista, além de analisar os relatórios do Snap Inc. para investidores.

Também entrou em contato com brasileiros que postaram em outras redes sobre o Snapchat, como Facebook e Instagram, para ouvir sobre suas experiências no aplicativo. Para entender melhor o que atrai os usuários, demos uma volta pelo aplicativo.

Também entramos em contato com a assessoria de imprensa do Snap Inc. no exterior para perguntar sobre a estratégia do Snap no Brasil, mas não tivemos retorno até o fechamento deste texto.

Reportagem de Beatriz Montesanti
Edição de Sérgio Spagnuolo e Samira Menzes
Snapchat
Acesse o NúcleoHub, nossa comunidade no Discord.