Se você não quer outra pandemia, cuide da Amazônia

Se, para você, soa estranho associar a preservação ambiental com a emergência de doenças infecciosas, você precisa acompanhar o que a ciência já sabe sobre isso. 

Por Letícia Sarturi, mestre em Imunologia, doutora em Biociências e Fisiopatologia, professora universitária, roteirista e podcaster no @EscutaACiencia

Se, para você, soa estranho associar a preservação ambiental com a emergência de doenças infecciosas, você precisa acompanhar o que a ciência já sabe sobre isso. 

No dia 5 de setembro, celebramos o dia da Amazônia e, embora pareça só mais um data simbólica, datas como essas são momentos importantes para discutirmos a preservação deste bioma, mas também para encontrarmos formas de repensar toda a nossa relação com o meio ambiente, diante do avanço das mudanças climáticas.

E nessa relação, a preservação ambiental tem implicação na prevenção de novas epidemias, sabia? 

Essa tem sido uma discussão frequente desde o início da pandemia de COVID.

No dia da Amazônia, na rede X (antigo Twitter), a secretária de Vigilância em Saúde e Ambiente, Dra. Ethel Maciel, explicou que a preservação da Amazônia e de outros biomas é imprescindível para a prevenção de doenças, visto que o desmatamento, além dos impactos ambientais, econômicos e sociais, leva a impactos na saúde, aumentando os riscos da emergência de antigas e novas doenças.

Para entender melhor essa relação entre desmatamento, mudanças climáticas e epidemias por doenças infecciosas, é preciso compreender que muitos patógenos, até mesmo desconhecidos, podem estar “ocultos” utilizando animais silvestres como hospedeiros. Devido à falta de preservação dos ecossistemas e à elevação da temperatura global e consequente derretimento de geleiras, patógenos desconhecidos podem chegar até nós.

A pesquisadora e divulgadora científica Dra. Mellanie Fontes-Dutra explica muito bem isso, em um fio recente, ressaltando a relação entre as temperaturas elevadas e a emergência de doenças já existentes, assim como a emergência de novas doenças.

Como bem colocado pela Dra. Mellanie, a própria COVID-19 nos mostra essa relação. Isso porque com a invasão dos ecossistemas, aumenta-se o risco de eventos zoonóticos, ou pulos de agentes infecciosos de uma espécie para a outra, como o SARS-CoV-2, que pode ter se aproveitado disso, no surgimento da primeira infecção no mercado de animais silvestres, em Wuhan.

 

E não é só isso. Outro ponto importante a ser levantado, quando falamos do risco de doenças infecciosas, diz respeito ao aumento do índice pluviométrico, devido às mudanças climáticas, o que pode acarretar em uma elevada proliferação de vetores de doenças infecciosas, como os mosquitos Aedes aegypti que transmitem o vírus da Dengue, Zika e Chikungunya.

Na Europa, a onda de calor, em virtude das mudanças climáticas, tem se mostrado uma ameaça à saúde por diversos motivos, dentre eles o advento de doenças infecciosas típicas de países tropicais e subtropicais, como a Dengue. Em Paris, o famoso fumacê, que é a pulverização de inseticidas, foi realizado recentemente, para conter o avanço do mosquito Aedes albopictus, que tem provocado uma epidemia de Dengue no Norte europeu. 

E olha que os problemas de saúde associados às mudanças climáticas nem são somente as doenças infecciosas. As recentes temperaturas elevadas no verão da Europa e o inverno quente que estamos vivendo no Brasil, o aumento na emissão de carbono na atmosfera são ameaças para a saúde humana e provocam, dentre outros problemas, distúrbios respiratórios e de pele, a exaustão, bem como, o descontrole de problemas cardiovasculares.

As temperaturas têm sido tão elevadas que se torna cada vez mais nítida a urgência de ações efetivas a fim de controlar o avanço das mudanças climáticas. Recentemente, a ONG Observatório do Clima compartilhou, na rede X, valores extremos de temperaturas do verão no Hemisfério Norte, sendo que este calor excessivo pode ter sido a causa da morte de milhares de pessoas.

Ainda, as mudanças climáticas, decorrentes dos impactos ambientais, provocam desastres como deslizamentos de terra e enchentes, que frequentemente afetam a vida de milhares de pessoas. Até mesmo nessas catástrofes, há uma suscetibilidade aumentada para o advento de doenças infecciosas. 

Na rede X, a Dra. Mellanie Fontes-Dutra alerta que além de todo o impacto na saúde mental, risco de acidentes com animais peçonhentos, as vítimas desses desastres podem estar suscetíveis também a doenças como leptospirose e dengue.

A leptospirose é uma doença provocada pela bactéria do gênero Leptospira, presente em fezes e urina de ratos e outros animais, que se acumula na água das enchentes, permitindo a transmissão da bactéria aos humanos, quando se tem contato pela boca, pele e olhos. Nesses desastres, o risco aumentado para a dengue está no acúmulo de água, em decorrência das enchentes, que leva à maior proliferação de mosquitos vetores. 

Diante do desastre do ciclone extratropical que atingiu o Rio Grande do Sul, a pesquisadora Karina Lima, que é geógrafa, divulgadora científica e doutoranda em climatologia pesquisando tempestades, eventos extremos e desastres, resgatou um fio, postado em Junho, explicando a relação dos ciclones extratropicais com as mudanças climáticas.

No post, Karina Lima explica que embora não possamos afirmar, sem uma investigação, que um ciclone extratropical seja resultado das alterações no clima, sabemos que o aquecimento global está influenciando o ciclo hidrológico.

E ainda, Karina coloca que estudos projetam que a frequência de ciclones extratropicais deve diminuir globalmente, com sua faixa de atuação migrando para os polos no hemisfério sul, mas os ciclones extremos tendem a ser mais destrutivos, com mais deles excedendo limites históricos de intensidade.

A saúde humana segue em risco, as chances iminentes de novas epidemias têm sido debatidas por cientistas que atuam, principalmente, na vigilância epidemiológica. Apesar disso, o debate não tem resultado em ações efetivas no controle sobre os impactos ambientais e as mudanças climáticas. Essas ações efetivas dependem ativamente de governantes e atores políticos. E o mundo não pode esperar.

Vivemos um período de caos diante de uma pandemia de uma doença desconhecida, a COVID-19 e pouco aprendemos com isso. A preservação de nossos biomas é uma ação importante que pode colaborar na redução dos impactos ambientais.

A redução do desmatamento da Amazônia é, sem dúvida, uma medida que provavelmente diminuiria o risco para a emergência de doenças infecciosas, visto que o aumento da transmissão de doenças, como a malária, foi observado em um período de maior desmatamento. Isso foi bem debatido pela página da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fiocruz, na rede X.

E por fim, se o advento de novas epidemias não comove e nem move as pessoas a colocarem em prática as ações necessárias para frear o avanço das mudanças climáticas, fica aqui esse vídeo para refletir sobre a preservação da Amazônia, pensando nas pessoas que lá vivem e que lutam protegendo este bioma. 

Pensemos nas pessoas, pensemos na conexão humana, tão importante, com a natureza e repensemos nossa relação com o meio ambiente.

Texto Letícia Sarturi
Edição Alexandre Orrico

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