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Após muita expectativa, foi apresentado na Câmara dos Deputados na noite de quinta-feira (27.abr.2023) o parecer preliminar do projeto de lei 2630/2020, o chamado PL das Fake News – texto que provavelmente vai para apreciação do plenário na próxima semana.

📝 A lei visa regular o funcionamento de plataformas digitais e aplicativos de mensagem no Brasil, e estabelece uma série de obrigações para as empresas provedoras.

ℹ️ O Projeto de Lei de Responsabilidade e Transparência para Plataformas Digitais é relatado pelo deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), e foi apresentado primeiramente no Senado por Alessandro Vieira (PSDB-SE), em 2020.

💯 O projeto de lei se aplica a plataformas – redes sociais, aplicativos de mensagens e provedores de busca – com mais de 10 milhões de usuários no Brasil.


Veja a tramitação do PL e documentos relevantes aqui

Leia o projeto na íntegra 👇


O Núcleo preparou um apanhado dos principais pontos do texto apresentado na quinta-feira.

  • 🪓 O texto não inclui a criação de uma entidade autônoma de regulação e fiscalização de plataformas digitais, algo que havia sido sugerido pelo governo e em versões anteriores.

SAIBA MAIS - Entidade reguladora OFF

A criação de uma entidade reguladora constava na proposta do Executivo com sugestões para o projeto de lei. Na avaliação de Orlando Silva, em entrevista dada à Globonews, o ponto enfrentava resistência na Casa e inviabilizaria a aprovação do texto.

Na versão atual, apresentada na quinta-feira, o texto não indica quem ficará responsável pela fiscalização e garantir que as plataformas cumpram com suas obrigações.

No capítulo "Da regulação dos provedores", o texto apresenta atribuições ao Comitê Gestor da Internet, mas não dá ao CGI poder de fiscalização.

Até terça-feira (2.mai.2023), quando o mérito do projeto será votado em plenário, deputados deverão chegar a uma nova solução.

ANATEL. Ainda na noite de quinta-feira, o presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Carlos Baigorri, defendeu que seja ela a entidade autônoma de supervisão no âmbito do projeto.

A escolha da Anatel é vista como temerária por especialistas, visto que é uma agência ligada ao Ministério das Comunicações. A Agência também já tem atribuições ligadas a telefonia e, portanto, relação com empresas de telecomunicação.

A Coalizão Direitos na Rede, que une diversas entidades da sociedade civil, publicou nota em que aponta que a Anatel não tem "a expertise necessária nos temas de regulação de plataformas, além de ter falhado recorrentemente no cumprimento de suas atribuições no setor de telecomunicações". A ideia de ter a agência como órgão supervisor das plataformas deve ser "inequivocadamente rechaçada", escreveu a CDR.

Autorregulação regulada. Uma das sugestões do Executivo era a de permitir que as plataformas pudessem constituir uma entidade de autorregulação. Silva não incorporou essa sugestão à versão mais recente do texto.

  • 🔎 Empresas terão que ser muito mais ativas em sua transparência com usuários, fornecendo informações sobre seus sistemas de recomendação de conteúdo e relatórios semestrais.

SAIBA MAIS - Transparência ON

Um dos pontos-fortes do texto são as obrigações de transparência das plataformas.

As empresas deverão informar, nos termos de uso, os parâmetros usados nos sistemas de recomendação de conteúdo de maneira a deixar claro para usuários o porquê deles terem recebido determinado conteúdo.

O texto também prevê a produção de relatórios semestrais de transparência que deverão ficar acessíveis no site das empresas em língua portuguesa, com informações sobre procedimentos de moderação de conteúdo.

O projeto de lei determina que empresas devem realizar e publicar anualmente uma auditoria externa e independente para avaliar se as obrigações estão sendo cumpridas.

  • 🎓 Boa notícia para pesquisadores e acadêmicos: o texto deixa explícito que acesso a dados (inclusive via APIs) para pesquisas terão que ser fornecidos gratuitamente.

SAIBA MAIS - Dados para pesquisas

No artigo 25, intitulado "Acesso à pesquisa":

Os provedores deverão viabilizar o acesso gratuito de instituição científica, tecnológica e de inovação a dados desagregados, inclusive por meio de interface de programação de aplicações, para finalidade de pesquisa acadêmica, observados os segredos comercial e industrial, a anonimização e a proteção de dados pessoais conforme a Lei no 13.709, de 14 de agosto de 2018 e conforme regulamentação.

Isso é incrivelmente importante, visto que grandes empresas, como Meta, TikTok, Twitter, Telegram e Kwai, são extremamente conservadoras com quem acessa suas APIs oficiais, inclusive até acadêmicos e pesquisadores.

>>> Saiba mais aqui.

  • 🦹‍♂️ Políticos terão sua imunidade parlamentar estendida às redes sociais.

SAIBA MAIS - Imunidade parlamentar

O artigo 33 do texto manteve a extensão da imunidade parlamentar às redes sociais. 

O dispositivo é considerado um dos mais problemáticos do projeto de lei, já que pode desencorajar redes sociais de moderarem conteúdo publicado ou veiculado por parlamentares, mesmo que nocivamente desinformativo. Na proposta do Executivo, esse dispositivo havia ficado de fora.

  • ⚖️ Plataformas poderão ser responsabilizadas civilmente por conteúdo gerado por terceiros que tenha sido impulsionado ou quando descumprirem obrigações de dever de cuidado.

SAIBA MAIS - Dever de cuidado

A obrigação do dever de cuidado se aplica a conteúdos ilícitos ou nocivos ligados ao seguinte rol de crimes, especificados no projeto de lei:

  • crimes contra o Estado Democrático de Direito e de golpe de Estado;
  • atos de terrorismo e preparatórios de terrorismo;
  • estímulo ao suicídio ou à automutilação;
  • crimes contra crianças e adolescentes;
  • crimes de discriminação ou preconceito por raça ou cor;
  • violência política contra a mulher;
  • infração sanitária, por dificultar a execução de medidas sanitárias quando tiver sido decretada situação de emergência em saúde pública.

A avaliação sobre o cumprimento ou não do dever de cuidado se dará sobre o "conjunto de esforços e medidas adotadas pelos provedores, não cabendo avaliação sobre casos isolados".

  • 📉 Empresas terão de conduzir análises recorrentes de risco sistêmico.

SAIBA MAIS - Análise de risco sistêmico

Plataformas terão de "identificar, analisar e avaliar diligentemente os riscos sistêmicos decorrentes da concepção ou do funcionamento dos seus serviços e dos seus sistemas relacionados, incluindo os sistemas algorítmicos". Pelo projeto, essa avaliação deverá ser publicada anualmente e antes de funcionalidades novas com potencial de impacto crítico serem introduzidas.

  • O projeto prevê maior responsabilidades de plataformas por conteúdo de terceiros e altera regime de responsabilização de intermediários estabelecido pelo artigo 19 do Marco Civil da Internet em vigor atualmente, dentro da noção de "protocolo de segurança", que poderá ser instaurado em casos específicos de riscos, negligência ou ação insuficiente por parte das empresas. Esse protocolo tem prazo de 30 dias, podendo ser prorrogado por mais 30.

SAIBA MAIS - Responsabilização por conteúdo

O projeto prevê, no capítulo II, que provedores podem ser responsabilizados civilmente "de forma solidária" pela:

  • reparação de danos causados por conteúdos de terceiros que tenham sido impulsionados na plataforma ;
  • por danos decorrentes de conteúdos gerados por terceiros quando houver descumprimento das obrigações de dever de cuidado no escopo do protocolo de segurança, que têm prazos e temas específicos.

Dessa forma, as plataformas deverão adotar "medidas de atenuação razoáveis, proporcionais e eficazes".

A proposta altera o entendimento do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que hoje estabelece regime de responsabilidade de intermediários em que uma plataforma só pode ser responsabilizada quando não agir sobre conteúdo que for alvo de decisão judicial.

  • 💰 Multa por descumprimento de decisão judicial (em prazo maior de 24 horas) pode chegar a R$1 milhão por hora de descumprimento.

SAIBA MAIS - Protocolo de segurança e sanções

O projeto introduz a noção de "protocolo de segurança", que poderá ser instaurado quando houver a iminência de riscos, negligência ou ação insuficiente por parte das empresas. Esse protocolo será instaurado por decisão fundamentada pelo prazo de 30 dias, podendo ser prorrogado por mais 30. 

No âmbito desse protocolo e após notificação, empresas poderão ser responsabilizadas civilmente pelos danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros quando demonstrado conhecimento prévio. A denúncia por usuários já configura "conhecimento prévio". 

Além do protocolo, o texto prevê que as empresas devem cumprir em até 24 horas decisões judiciais que determinarem a remoção de conteúdo ilícito sob pena de multa de R$50 mil a R$1 milhão por hora de descumprimento. 

As sanções previstas pelo projeto ficaram escalonadas da seguinte forma:

  •  advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas; 
  • multa diária; 
  • multa simples, de até 10% (dez por cento) do faturamento do grupo econômico no Brasil no seu último exercício ou, ausente o faturamento, multa de R$10 até R$ 1 mil por usuário cadastrado do provedor sancionado, limitada, no total, a R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais), por infração; 
  • publicação da decisão pelo infrator; 
  • proibição de tratamento de determinadas bases de dados;
  • suspensão temporária das atividades.
  • 💸 Remuneração por conteúdo jornalístico aparece no texto, mas deixa em aberto para uma regulamentação à parte

SAIBA MAIS - Remuneração do jornalismo

O projeto estabelece de forma bem ampla e genérica que provedores deverão remunerar veículos de mídia por conteúdos jornalísticos em texto, vídeo, áudio ou imagem que sejam utilizados, mas deixa isso para ser estabelecido por uma outra regulação.

Alguns critérios foram estabelecidos. Para serem elegíveis, os veículos precisarão:

  • ter ao menos 2 anos de criação;
  • produzir jornalismo de forma regular, organizada e profissionalmente;
  • manter endereço físico e editor responsável no Brasil.

O texto deixa para as empresas de tecnologia e os veículos se virarem pra achar um acordo: É livre a pactuação entre provedor de aplicação e empresa jornalística, garantida a negociação coletiva pelas pessoas jurídicas previstas.

Esse artigo deve gerar novas regulamentações para esclarecer critérios específicos de remuneração.

Por Laís Martins
Edição Sérgio Spagnuolo

Texto atualizado à 15h08 de 28.abr.2023 para incluir posicionamento da Coalizão Direitos na Rede sobre Anatel.

RegulaçãoGeralzão
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