Com 5G, redes sociais terão novos formatos e velhos problemas

Além dos novos formatos, continuidade do modelo comercial vigente cria riscos para desinformação e moderação de conteúdo
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A implantação da nova rede de telefonia móvel 5G tem o potencial de mudar as redes sociais como as conhecemos.

Há a possibilidade de experiências mais imersivas em 3D e recursos que sequer conseguimos conceber agora. É certo que a velocidade de navegação aumentará bastante, elevando o volume de produção, a intensidade visual e qualidade técnica do conteúdo produzido e consumido.

Mas, com novos formatos, velhos problemas podem escalar, como disseminação de desinformação e de disparidade digital, uma vez que grandes centros urbanos e bairros ricos serão provavelmente os mais privilegiados na implementação do 5G, com início previsto para julho de 2022.  


É importante porque…
  • Com proximidade da implementação no Brasil, problemas potenciais começam a emergir
  • Especialistas vêm alertando que, em lugar de ampliar conectividade, 5G pode aprofundar disparidades

Uma palavra tem pipocado constantemente nos últimos tempos que pode ilustrar bem o tipo de problema que o 5G vai trazer para redes sociais: o metaverso.

Poucos anos atrás parecia algo distante, mas há praticamente um consenso de especialistas que metaverso vem aí com força – independentemente se a Meta (antes Facebook) fizer do seu jeito ou não. Diversos gigantes da tecnologia, como Amazon, Microsoft, Snap, NVidia, Tencent e Epic Games já estão trabalhando em suas próprias versões de metaverso, segundo a Reuters.

Assim, o 5G vai conectar o metaverso e, entre muitas outras coisas, possibilitar que as interações na internet se tornem imersivas num nível jamais visto antes, levando as redes sociais para um novo patamar de complexidade e possibilidades.


Isso faz com que problemas sistêmicos que persistem e pioram até hoje – como desinformação e dificuldade na moderação de conteúdo – nesses ambientes sejam difíceis, talvez até impossíveis, de prever, criando desafios de planejamento e políticas claras para tratar de práticas sensíveis.

"Se hoje nós estamos falando de estratégias relacionadas a essa visão 2D, o momento que a gente tiver a possibilidade de ter uma visão 3D em que a situação vai ser muito mais imersiva o potencial de desinformação também se torna mais amplo", disse ao Núcleo Christian Perrone, coordenador da área de Direito e Tecnologia do ITS Rio.

O Second Life, ambiente virtual que fez sucesso mais de uma década atrás e, sim, ativo até hoje, pode ajudar a dar uma boa ideia do que está por vir.

Em 2019 vieram à tona informações de um processo judicial no qual um diretor de segurança da Linden Lab, que mantém o Second Life, alegou que a empresa fazia vista grossa para atos simulados de abuso sexual infantil e potencial de lavagem de dinheiro via plataforma.

Grave? Sim, e isso em cima de uma tecnologia criada vinte anos atrás.

O que é 5G?

É a próxima geração de tecnologia de telefonia móvel, que promete velocidades significativamente maiores do que o estágio atual (4G).

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), responsável por regular o setor de telefonia, realizou no começo de novembro o leilão para as faixas de frequência que serão utilizadas para o 5G.

Segundo a agência, alguns avanços técnicos principais são esperados com essa nova geração de tecnologia celular

  • Aumento das taxas de transmissão (maior velocidade)
  • Baixa latência (tempo mínimo entre o estímulo e a resposta da rede)
  • Maior densidade de conexões (quantidade de dispositivos conectados em uma determinada área)
  • Maior eficiência espectral (quantidade de dados transmitidos por faixa de espectro eletromagnético)
  • Maior eficiência energética dos equipamentos (economia e sustentabilidade)
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ALMA DO NEGÓCIO

Para além do formato, também é preciso olhar para alguns aspectos do modelo de negócios que as operadoras de telefonia móvel escolherão quando o 5G for adotado mais amplamente.

É aí que entra a política de zero-rating, que consiste em acordos entre operadoras e empresas e serviços digitais e, especialmente, redes sociais para ofertar acesso ilimitado a essas plataformas, sem descontar de franquias de dados. Isso permite que usuários utilizem Whatsapp e Facebook mesmo depois que os dados do pacote acabam, por exemplo, ou que utilizem serviços do Google.

Alvo de mais críticas do que elogios entre especialistas, a política ainda assim divide opiniões.

Por um lado, explica Perrone, do ITS, uma parcela significativa da população ganha conexão e capacidade de comunicação por meio do zero-rating.

Por outro, essas políticas ferem o princípio de neutralidade da rede, estabelecido pelo Marco Civil da Internet. Esse princípio, como explica o InternetLab, defende que "todos os dados que trafegam na rede devem ser tratados da mesma forma e com a mesma velocidade (...) Na prática, isso significa que os provedores de conexão não podem priorizar o acesso a uma aplicação em detrimento a outra".

E é exatamente isso que a política do zero-rating faz: prioriza o acesso a uma aplicação em detrimento de outras.

A prática é problemática do ponto de vista concorrencial, já que é ilógico que usuários queiram migrar de um aplicativo que não consome sua franquia de dados para um que consuma.

Mas é também problemática do ponto de vista da desinformação, uma vez que usuários ficam com acesso limitado a informações.

Imagine essa situação: Uma pessoa recebe o link de uma notícia por WhatsApp. Seja a notícia falsa ou real, se a pessoa não tiver um pacote de dados, ao clicar no link que redireciona para o site de notícias, ela não conseguirá ler a notícia na íntegra porque não tem dados para isso. E se ela resolver simplesmente encaminhar o link para seus contatos, ela terá encaminhado um conteúdo que ela conhece apenas parcialmente, pelo título exibido dentro da conversa no WhatsApp.

Em poucas palavras: paga-se pela informação, mas a desinformação é gratuita.

TARIFA ZERO

Isso já é um problema hoje, e no 5G tende a piorar. "É colocar esteroides no problema que a gente já têm de competição e acesso à informação", compara Perrone.

Se as empresas de telefonia não mudarem o modelo de negócios, as pessoas tendem a aderir ainda mais aos aplicativos cobertos pela política do zero-rating. O 5G vai trazer formatos com mais qualidade, e, assim, consumir mais dados.

Com cobertura do zero-rating, usuários poderão usar a plena capacidade do 5G – maior velocidade, menor latência (tempo de resposta). Com isso vem também o receio em usar aplicativos fora do zero-rating, considerando que o pacote de dados pode não render nada, já que vai consumir mais banda larga.

Esse movimento tende a concentrar a massa dos usuários em um número restrito de aplicativos. "Os grandes beneficiários desse modelo de negócios que temos hoje são as Big Tech que mantêm planos zero-rating", disse Diogo Moysés, integrante da Coalizão Direitos na Rede e coordenador do programa de direitos digitais e telecom do IDEC.


Para Moysés, esse deveria ter sido o momento em que as operadoras garantiriam uma migração no modelo de negócios para um onde o acesso à internet móvel também fosse ininterrupto, de certa forma parecido com o da internet fixa.

Segundo ele, faltou também uma atuação mais incisiva de órgãos reguladores, como a Anatel, para que o modelo comercial não seja tão desfavorável ao usuário.

No Brasil, a política do zero-rating já foi alvo de diversas investigações pelo CADE e pelo Ministério Público Federal nos últimos anos. Em junho deste ano, o MPF notificou a Anatel solicitando explicações sobre o livre uso do WhatsApp.

"O que nos parecia fundamental nesse processo é que o ponto de partida para uma eventual implantação do 5G tinha que ter sido um olhar nos problemas que existem hoje e que nós precisamos enfrentar.

No fim, em vez de ampliar a conectividade e incluir mais brasileiros na rede, o 5G pode acabar por aprofundar as disparidades.

Grande parte da população, sobretudo nas classes sociais mais pobres, têm acesso à internet somente pela telefonia móvel, sob esse modelo, e para muitos usuários as redes sociais são efetivamente a internet, já que não têm motivação para acessar outros sites e serviços.

"A manutenção [do modelo de negócios] vai render um quadro, senão idêntico, pior" – Diogo Moysés, da Coalizão Direitos na Rede

"A gente tem uma tendência de aumentar a desigualdade porque o 5G começará sendo implementado pelos grandes centros urbanos e seus bairros ricos enquanto as zonas rurais, periféricas, áreas remotas continuarão com uma conexão absolutamente precária baseada num modelo de negócio que não permite que as pessoas utilizem o pleno potencial da internet".

Texto Sérgio Spagnuolo
Reportagem Laís Martins
Arte Rodolfo Almeida
Edição Alexandre Orrico e Samira Menezes

O que é metaverso? - Vídeos - Canaltech
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