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Em setembro de 2020, um funcionário do Facebook organizou dossiê em que propunha uma alteração na interface da plataforma como forma de reduzir a distribuição de conteúdos de "baixa integridade". O argumento era de que recursos para encorajar engajamento na plataforma, como um botão adicional de compartilhar, curtir ou seguir página, amplificavam esses tipos de conteúdo.

Sob o título de UI Desamplificação [UI é User Interface],  o dossiê visto pelo Núcleo como parte dos documentos revelados ao #FacebookPapers, sugeria que a decisão de incluir esse tipo de botão de ação deveria atender a padrões mais seletivos de eligibilidade.

Assim, esse tipo de filtro funcionaria como uma alavanca adicional para reduzir a distribuição de conteúdos de baixa integridade.

É importante porque
  • Mostra como o Facebook internamente tem ideias de como implementar mudanças técnicas para diminuir o alcance de conteúdo tóxico, se quiser
  • Brasil é um dos países mais sensíveis a conteúdos nocivos, segundo classificação do próprio Facebook, e iniciativas do tipo poderiam beneficiar usuários brasileiros

Um botão de ação que é discutido no dossiê é o botão de compartilhar que aparece ao final de vídeos assistidos no Facebook. Um dos riscos identificados é de que o botão encoraja compartilhamento de conteúdos de baixa integridade. A solução proposta é a de não exibir esse botão ao final de vídeos.

O New York Times reportou sobre a discussão interna do assunto.

O exemplo abaixo é print tirado pelo Núcleo, e não dos documentos revelados. Como parte do acordo para publicação do material, foi solicitado para que os veículos não publicassem prints de documentos, a fim de não comprometer a privacidade de outros funcionários do Facebook.

Print tirado pelo Núcleo que mostra o botão de compartilhamento

Não fica claro, a partir dos documentos, o que seriam conteúdos de "baixa integridade" no entendimento da empresa, mas em geral podem ser entendidos como conteúdos tóxicos ou nocivos, como, por exemplo, desinformação sobre vacinas ou violência gráfica.

Uma mudança do tipo, além de garantir que o FB em si não estivesse contribuindo para a amplificação de conteúdo e parceiros desse tipo, contribuiria para cumprir duas metas do "pilar de integridade" da empresa:

  • "Nós só recomendamos e ampliamos o que podemos defender [stand behind, no inglês]"
  • "Nós podemos defender [stand behind, no inglês] o conteúdo e parceiros que têm mais sucesso em nossas plataformas".

Sob essa abordagem, o Facebook faria mudanças para não disponibilizar esses recursos em conteúdos ou criadores que tivessem repetidamente violado normas de comunidade, em conteúdos de temas de alto risco e para países e regiões que estivem sob risco de desinformação viral ou conteúdo de ódio -- como é o caso do Brasil.

Documento visto pelo Núcleo mostra que o Facebook classificava o Brasil como nível dois num ranking de prioridades para o ano de 2021, ao lado de outros países latino-americanos, do Oriente Médio, Ásia e de França e Alemanha.

#FacebookPapers: Brasil entre países mais sensíveis a conteúdos violentos
Núcleo teve acesso ao documento editado pela assessoria de Frances Haugen e fornecido ao Congresso dos EUA

Os documentos vistos pelo Núcleo não detalham, porém, se o FB efetivamente aplicou as mudanças recomendadas nessa ocasião específica.

Segundo a empresa, melhorias estão sempre sendo feitas. Em nota, o Facebook (que agora se chama Meta), disse sobre a pesquisa:

"Estamos sempre fazendo mudanças de produto para melhorar a experiência das pessoas na plataforma. Investimos em pesquisa para nos ajudar a descobrir lacunas em nossos sistemas e identificar problemas a serem corrigidos".

Uma mudança na interface para usuários baseada em pesquisa interna, por exemplo, foi anunciada em um post no blog para imprensa em jun.2020: o Facebook disse que daria mais contexto a seus usuários, implementando tela de notificação quando as notícias que estão prestes a compartilhar foram publicadas há mais de 90 dias.


COMO FIZEMOS ISSO

Essas informações fazem parte de documentos revelados à Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC, na sigla em inglês) e fornecidas ao Congresso dos Estados Unidos de forma editada pela assessoria legal de Frances Haugen. As versões editadas recebidas pelo Congresso dos EUA foram revisadas por um consórcio de veículos de notícias. O Núcleo Jornalismo teve acesso ao documento.

O Núcleo foi convidado a participar do consórcio de veículos internacionais que possuem acesso aos documentos trazidos à tona pela ex-funcionária do Facebook Frances Haugen, no que ficou conhecido como Facebook Papers.

Esses documentos foram primeiramente noticiados pelo Wall Street Journal, que chamou a série de Facebook Files.

Texto Laís Martins
Edição Sérgio Spagnuolo

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